CEL AYRTON JOÃO DE SOUZA
Ex-Comandante-Geral da Polícia Militar em Santa Catarina, o Cel Ayrton João de Souza deixou contribuições históricas nos 20 anos em que esteve a serviço da corporação. Filho do Cel Maurício Alexandre Spalding de Souza e irmão do Cel Ney de Sousa, ele entrou para a PMSC através do Curso de Formação de Oficiais, em 1949. No ano seguinte, concluiu a formação como primeiro colocado da turma, o que já “denunciava” sua capacidade de liderança.
Apesar da rotina extenuante na caserna, o Cel Ayrton nunca abriu mão da vocação para atuar na área da Saúde, cursando Odontologia no período noturno e, posteriormente, trabalhando como dentista, no consultório instalado junto à casa dos pais, após o expediente militar. Naquela época, nos anos 50, era quase inusitado prestar serviços à noite, mas a clientela – formada em sua maioria por trabalhadores do comércio – logo aprovou a iniciativa, pois as consultas noturnas permitiam ao paciente conciliar os compromissos profissionais com o tratamento dentário.
Na Polícia Militar, seus diferenciais visíveis, como dedicação, sensibilidade e ética, não tardaram a revelar novas oportunidades e, na mesma medida, grandes desafios. Ao ser promovido pelo princípio de merecimento ao mais alto posto da PMSC, aos 35 anos, o Cel Ayrton acumulava as mais distintas experiências, como professor de várias disciplinas, diretor da Escola de Armas Automáticas, diretor da Escola Regimental Marechal Guilherme, diretor do Curso de Formação de Graduados, diretor do Curso de Formação de Oficiais, presidente do Conselho Permanente da Justiça Militar, diretor do Curso de Formação de Oficiais Intendentes e Delegado Especial de Polícia, em Araranguá e Joinville.
Coube ao Cel Ayrton, por exemplo, ser delegado em Joinville justamente no período em que o lendário assaltante João Acácio Pereira da Costa estava preso no local. Mais conhecido como “o bandido da luz vermelha”, João Acácio chegou a ter sua trajetória de crimes e fugas inexplicáveis contada em filme, tamanha sua habilidade para burlar as grades e reincidir na violência. Em Joinville não seria diferente, com o “bandido” recuperado na mesma data pela equipe plantonista na delegacia.
O período de ditadura militar, em contrapartida, não chegou a gerar contratempos, conforme lembra o Oficial designado, em 1964, para controlar toda a correspondência relacionada aos presos políticos recolhidos à corporação. “Todos eram bem tratados e saíram de lá meus amigos”, relembra, com tranquilidade. “Mantive uma amizade muito grande com o Gen Aragão, Comandante da 5ª Região Militar, e a polícia militar tinha uma boa relação com a marinha, o exército e a aeronáutica. Para mim a ditadura foi um período de firmeza nos atos”, avalia.
Comandante-Geral mais jovem entre os Oficiais que, historicamente, assumiram o comando da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar no país, o então Chefe do Estado Maior-Geral passou a responder, interinamente, pelo comando da corporação aos 35 anos. Três anos mais tarde, ele voltaria à função para exercer o comando por um breve porém profícuo período. Entre as contribuições do Cel Ayrton, claramente presentes em sua memória 45 anos após ter entrado para a Reserva, estão a manutenção do CFO em Florianópolis, a construção do campo de futebol na Trindade, a estruturação da banda Band Show, o reaparelhamento do Corpo de Bombeiros e a garantia de que a Polícia Militar manteria o vínculo direto com o Governador, sem subordinação à Secretaria de Estado voltada à segurança pública.
“Naquela época havia um movimento para que os Oficiais de Santa Catarina estudassem em São Paulo ou no Rio de Janeiro. Eles apresentavam razões que quase me faziam concordar em levar o curso para fora. Mas eu estava convencido de que seria um retrocesso e quando assumi a direção do CFO consegui a transferência do curso para a Trindade. Também, quase sem recursos, com máquinas do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, conseguimos fazer a terraplanagem e construir os campos de esportes onde até então só havia barranco, no Centro de Ensino”, conta.
No campo da teoria, o Cel Ayrton criou o Curso de Formação de Oficiais Intendentes, com foco na gestão das finanças, e promoveu a adaptação do CFO à Lei de Diretrizes e Bases, que garantia ao Oficial o diploma de Ensino Médio. “Assim foi possível forjar os alunos, lapidar quando ainda eram jovens, em vez de trazê-los do centro do país sem conhecer a realidade da nossa polícia”, comemora o ex-Comandante-Geral que, desde os anos 60, já defendia a ampliação da presença feminina no efetivo da PM e do CBM. “As mulheres são competentes e mais delicadas no trato com o público”, observa.
Ao deixar a Polícia Militar, em 1969, o Oficial e dentista experiente, com capacitação inclusive nos Estados Unidos, o que era um privilégio na época, continuou dando provas de sua liderança e espírito de vanguarda. Em 1972 foi escolhido por uma equipe de médicos para instalar e gerenciar a Medsan em Florianópolis, que mais tarde viria a ser a Unimed. Os 14 anos de dedicação à consolidação de um plano de saúde sem precedentes na região foram seguidos por outro projeto pioneiro: o loteamento do Jardim Santa Mônica, hoje um dos bairros mais valorizados da Capital, mas que nos anos 70 se limitava a um mangue desabitado e distante.
Casado com Waltraut Kimmel de Souza, a Tatau, há quase 60 anos, pai de quatro filhos que não hesitam em seguir seu exemplo de retidão, o Cel Ayrton nunca poupou fôlego para concretizar seus sonhos. Ex-atleta da Seleção Catarinense Universitária de vôlei e basquete, do Figueirense – onde jogou futebol por quatro anos -, de bocha, ciclismo, tênis e natação, ele encontra energia no compromisso, auto-imposto, de ser exemplar. “Ser ético, participativo e um exemplo para as próprias famílias, os colegas e a sociedade é uma obrigação do militar. E minha mensagem para quem está ingressando nesta vida é que seja honesto e tenha uma vida regrada, para quando atingir a minha idade só ter lembranças boas e nenhum arrependimento”.
COM O PRESIDENTE JÂNIO QUADROS
COM O GOVERNADOR IVO SILVEIRA
COM O PRÍNCIPE PHILIP, DA INGLATERRA
COM O ESPOSA E A FILHA SUZANA, EM 2014.
ENTREVISTA E REDAÇÃO: Jornalista Ana Lavratti – jornalista@acors.org.br